Como Bolsonaro virou réu? Veja cronologia da derrota em 2022, 8 de Janeiro e prisão domiciliar

Interrogatórios dos réus da Ação Penal (AP) 2668. Foto: Fellipe Sampaio/STF

Uma atmosfera de tensão marcou o pós-eleição em 2022, quando o então ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ganhou o pleito sobre o então presidente Jair Bolsonaro (PL). O derrotado se negou a reconhecer a vitória do petista, de volta à cena política após ter condenações anuladas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

A vitória de Lula foi apertada, o que inflamou ataques de bolsonaristas contra a Justiça Eleitoral, STF, em especial ao ministro Alexandre de Moraes, e à urna eletrônica. Sem provas, a campanha perdedora ecoava desconfianças que sugeriam fraude. Ao mesmo tempo, manifestações vistas como golpistas explodiam em Brasília, enquanto caminhoneiros fechavam rodovias. Em meio ao caos, Bolsonaro seguia em silêncio.

Àquela altura, os gritos de quem não aceitava o resultado das urnas era uníssono por intervenção militar. Na frente de quartéis do Exército, manifestantes permaneceram por semanas até a chegada do dia 8 de janeiro de 2023, quando o Congresso Nacional, STF e Palácio do Planalto foram invadidos e depredados, policiais, agredidos, e até a réplica da Constituição de 1988, furtada.

Enquanto uma tentativa de ruptura democrática acontecia, Bolsonaro estava recluso nos Estados Unidos, em viagem feita no dia 30 de dezembro de 2022, antevéspera da posse de Lula. O ex-presidente já havia declarado que não passaria a faixa para o petista, depois do ritual da tradicional subida da rampa do Planalto.

Bolsonaro suspeito de liderar trama golpista

Em decorrência do 8 de Janeiro, centenas de manifestantes foram presos e condenados. Em paralelo, uma investigação autorizada pelo Supremo apontava um plano de golpe de Estado, supostamente, liderado por Bolsonaro e articulado pela cúpula do então governo, antes da transição para Lula.

Entre os destaques das centenas de páginas do relatório final do inquérito, minuta golpista, reuniões suspeitas e até um plano para assassinar o ministro Moraes, relator da ação penal, Lula e o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB). Tudo isso levou a Polícia Federal (PF) a indiciar Bolsonaro e aliados, motivou a Procuradoria-Geral da República (PGR) a denunciar os investigados e fez a Primeira Turma do STF torná-los réus, divididos em vários núcleos.

Bolsonaro e outros oito denunciados estão no chamado “Núcleo 1” do processo, o primeiro grupo a ser julgado pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.

Linha do tempo entre 2022 ao julgamento de Bolsonaro

Na cronologia de dois anos de investigação, o cenário de tensão pós-eleitoral evoluiu para uma ação penal que se aproxima da decisão da Primeira Turma do STF que pode selar o futuro político de Jair Bolsonaro, atualmente em prisão domiciliar.

Abaixo, veja a linha do tempo com fatos que culminaram na ação penal contra o ex-presidente e aliados, cujo julgamento acontece entre os dias 2 e 12 de setembro!

30 de outubro de 2022 – resultado das eleições

Bolsonaro perde as eleições para Lula, adota o silêncio e não reconhece a derrota. A partir de então, apoiadores aderem a manifestações violentas e bloqueiam rodovias.

2 de novembro de 2022 – declaração de Bolsonaro

Devido ao grau de violência e prejuízo causado por motim dos caminhoneiros, Bolsonaro publicou um vídeo em que pedia o fim dos bloqueios nas rodovias, ao mesmo tempo em que defendia “protestos de outra forma, em outros locais”.

O apelo que eu faço a você: desobstrua as rodovias, proteste de outra forma, em outros locais, que isso é muito bem-vindo. Faz parte da nossa democracia (Jair Bolsonaro)

22 de novembro de 2022 – anulação de votos

Valdemar da Costa Neto, presidente do partido de Bolsonaro, liderou uma ação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para pedir a anulação dos votos de cerca de 280 mil urnas usadas no segundo turno. Sem provas, o PL alegou inconsistências nos aparelhos. O objetivo era ter uma justificativa legal para não certificar a vitória de Lula e/ou reverter o resultado do pleito.

23 de novembro de 2022 – Moraes multa PL

Em resposta ao pedido de anulação do PL, o ministro Alexandre de Moraes, então presidente do TSE, negou a liminar e multou o partido em R$ 22,9 milhões ao alegar “má-fé”.

1º de janeiro de 2023 – posse de Lula

Lula é empossado presidente pelo terceiro mandato, em cerimônia sem a presença de Bolsonaro, que estava nos EUA e não quis participar da troca de comando.

8 de janeiro de 2023 – atos antidemocráticos em Brasília

Milhares de manifestantes, muitos deles apoiadores de Bolsonaro e com faixas que pediam intervenção militar, invadem e depredam os prédios localizados na Praça dos Três Poderes, em Brasília. O objetivo era derrubar o governo Lula.

Abril, maio e setembro de 2023 – caso Mauro Cid

Em abril, o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, foi alvo de operação em decorrência das joias sauditas, presentes dados ao então presidente Bolsonaro que teriam sido desviados.

Em maio, Cid foi preso por falsificação de cartões de vacina, inclusive o de Bolsonaro e da filha do então presidente com a então primeira-dama Michelle.

Já em setembro, Cid foi solto após acordo de delação premiada ser homologado pelo ministro Alexandre de Moraes. Em depoimentos, o ex-ajudante de ordens detalhou o suposto esquema golpista envolvendo Bolsonaro e militares.

8 de fevereiro de 2024 – operação da PF

PF deflagra a “Operação Tempus Veritatis” para investigar a atuação de Bolsonaro e aliados em plano golpista que manteria o “então presidente da República no poder”. A investigação apontou que a disseminação de fake news contra as eleições era uma estratégia para “viabilizar e legitimar uma intervenção militar, em dinâmica de milícia digital”.

Segundo a PF, a falsa acusação de fraude eleitoral era reiterada pelos investigados desde 2019 e persistia mesmo após os resultados do segundo turno das eleições de 2022.

21 de novembro de 2024 – Bolsonaro é indiciado pela PF

PF conclui a investigação e encaminha o relatório final para o STF, com o indiciamento de Bolsonaro e mais 36 por tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e organização criminosa.

Entre os indiciados, além de Bolsonaro, o comandante da Marinha, outros generais, como Braga Netto (candidato a vice na chapa de Bolsonaro) e Augusto Heleno, o ex-ministro da Justiça e Segurança Púbica Anderson Torres, o deputado federal Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Informações (Abin), e Mauro Cid.

18 de fevereiro de 2025 – denúncia da PGR

Dos 36 indiciados pela PF, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, denunciou Bolsonaro e outros 33 ao STF, sob a acusação de estimular e realizar atos contra o Estado Democrático de Direito. Todos respondem por cinco crimes, cujas penas podem chegar a 40 anos.

Segundo a denúncia da PGR, a persistente acusação de fraude nas urnas “era a forma de manter a militância do Presidente da República [Bolsonaro] animada, pedindo intervenção militar, em famigerados acampamentos montados em frente a quartéis do Exército em várias capitais do país”.

26 de março de 2025 – Bolsonaro vira réu

A Primeira Turma do STF, por unanimidade, torna Bolsonaro réu por liderar a tentativa de golpe de Estado, acompanhado de sete aliados acusados de integrarem o “Núcleo 1” ou “Núcleo Crucial” da trama golpista. A defesa de todos negam a denúncia da PGR.

10 de junho de 2025 – depoimento de Bolsonaro na 1ª Turma do STF

Bolsonaro é ouvido pelos ministros da Primeira Turma do STF, ocasião em que negou as acusações da PGR e até fez brincadeira com Moraes, quando o convidou para ser vice-presidente na eleição de 2026.

Sobre o 8 de Janeiro, Bolsonaro negou ter incentivado os ataques e chamou os apoiadores que pediam intervenção militar de malucos.

14 de julho de 2025 – alegações finais da PGR

PGR apresenta alegações finais e pede condenação dos réus da tentativa de golpe de Estado, inclusive de Bolsonaro. O documento cita “amplo conjunto probatório, como manuscritos, arquivos digitais, trocas de mensagens e planilhas que revelam a trama conspiratória contra as instituições democráticas”.

4 de agosto de 2025 – prisão domiciliar

Alexandre de Moraes determina prisão domiciliar de Bolsonaro por descumprimento de medidas cautelares, após ordem que o impedia de usar as redes sociais. A decisão aconteceu depois que o ex-presidente participou, por videochamada, de ato bolsonarista contra o STF e governo Lula.

15 de agosto de 2025 – julgamento de Bolsonaro

STF marca o início do julgamento de Bolsonaro e dos demais réus do Núcleo 1. O ministro Cristiano Zanin, presidente da Primeira Turma, convocou sessões extraordinárias entre os dias 2 e 12 de setembro.

Veja quem são os réus do Núcleo 1

  • Jair Bolsonaro, ex-presidente da República;
  • Alexandre Ramage, deputado federal e ex-diretor da Abin;
  • General Almir Garnier, ex-comandante da Marinha;
  • Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do Distrito Federal;
  • General Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI);
  • General Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa;
  • General Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil e candidato a vice na chapa de 2022;
  • Tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.

5 acusações contra os réus do Núcleo 1

  • organização criminosa armada;
  • golpe de Estado;
  • tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito;
  • dano qualificado; e
  • deterioração de patrimônio tombado.